“Pau de Arara nunca mais” gritou Aura Moreti no evento de lançamento do livro Luta – Substantivo Feminino

Publicado  quarta-feira, 9 de junho de 2010

O dia era de comemorações: o lançamento do livro Luta – Substantivo Feminino foi um sucesso. Aura Moreti, Maria Diva e Rose Nogueira estavam presentes para fazer valer o direito à memória e à verdade. O livro conta a história de mulheres torturadas, desaparecidas e mortas na resistência à ditadura.

As três, que tiveram seus depoimentos impressos em algumas páginas, assistiram atentas ao pronunciamento do Ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, Paulo Vannuchi e, ao final, um grito de desabafo emocionou toda a platéia “pau de arara nunca mais!” protestou Áurea Moreti.

Esta senhora, de cabelos grisalhos e olhar terno, causou reações como lágrimas, aplausos e gritos entusiasmados.

Após o evento, depois de autografar diversos exemplares e receber alguns abraços carinhosos do público, sentaram-se em um banco de madeira em frente à PUC de São Paulo (onde aconteceu o lançamento) e conversaram com nossa equipe.

Relembrar os tempos difíceis não é agradável, mas para elas, a memória é a única forma de garantir que a tortura não aconteça nunca mais.

Por causa de sua prisão no DOPS, Rose Nogueira (ex-militante da Ação Libertadora Nacional – ALN e jornalista) teve uma infecção que a deixou estéril. Ela contou que acabara de ter seu primeiro filho quando foi presa. “Eu sangrava e não tinha absorvente. Eram os quarenta dias do parto”. Neste período, Rose foi assediada e ameaçada de ficar sem seu único filho.

Maria Diva contou que, por ser mulher e negra, o preconceito era ainda maior: “perguntavam o que eu estava fazendo ali, diziam que eu deveria estar no fogão”. No DOI – CODI, além de tortura física, ela sofreu tortura psicológica: “me colocaram numa sala com uma música muito alta, que fazia um barulho na minha cabeça por umas duas horas, quando saí, pensei que ia enlouquecer”.

Áurea Moreti, ex-militante das Forças Armadas de Libertação Nacional (FALN), era estudante e enfermeira quando foi presa. Foram muitas sessões de choques elétricos, pau de arara, assédio e espancamento. “A maior arma que a gente tinha era a gente mesmo, porque fazia, enfrentava, mobilizava. A gente não estava preocupado em ter espingarda, o que nós queríamos era o retorno à democracia e que a perseguição, como estava sendo feita, parasse.”

As amizades parecem ter sido a única herança boa deste período. Enquanto conversavam, demonstravam um grande carinho umas pelas outras e uma simpatia sem igual com nossa equipe. Alguns anos após os acontecimentos, todas conseguiram retomar suas vidas. Demorou um pouco para deixarem de ser vigiadas através de grampos no telefone, investigações de documentos apresentados e desconfiança por parte dos empregadores. As marcas deixadas pela Ditadura Militar fizeram-nas continuar lutando por justiça até os dias atuais.

Rose é jornalista e defensora de direitos humanos: “Hoje minha principal luta é contra a marginalização dos pobres”, relata. Áurea vive em Ribeirão Preto e é enfermeira da Secretaria Municipal de Saúde. Maria Diva se aposentou e ainda mora em São Paulo.

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